quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Eu e os Outros: uma Amizade de várias cores.




Forever Babes

Num mundo tão árido como aquele em que vivemos hoje, há que valorizar, cada vez mais, o que vale a pena: família e amig@s. São ambas dimensões que garantem a nossa sobrevivência, são porto de abrigo e lugares de afectos, que traduzem, de forma inequívoca, a nossa humanidade.

O tema hoje é o da Amizade, esse valor supremo a que nos devemos agarrar como lapas a rochas, porque verdadeiro, escolhido, são e único.

Tenho o privilégio de ter alguns amig@s para a vida, que me têm acompanhado ao longo do percurso, com tudo o que isso implica: bons e maus momentos, profundas tristezas e grandes alegrias, silêncios e algazarras, discussões, trocas de ideias, convergências e algumas divergências, enfim, tudo o que importa registar e nalguns casos, também, esquecer, perdoar e ser perdoada.

Um dos meus maiores prazeres é fruir da companhia de 7 mulheres - número mágico - que são minhas amigas há quase 2 décadas!
 
Fomo-nos "coleccionando" por etapas, tendo-nos conhecido todas num dos nossos primeiros locais de trabalho, uma agência de publicidade que foi referência no mercado da comunicação durante algumas décadas, até fenecer lentamente. Dela só resta o nome mítico, o resto, "já era"! Felizmente a Amizade perdurou, amadureceu, enriqueceu-se e, tal como um excelente vinho tinto, transformou-se em preciosidade.
 
Sendo todas tão absolutamente diferentes, partilhamos, ao longo dos anos de quase tudo um pouco, e fazemos de cada reunião um evento especial, mesmo quando os assuntos são sérios e graves.
 
Desde há anos que elegemos um fim-de-semana de verão para uma fuga a 8. Marcamos com muita antecedência e vamos fazendo a contagem decrescente no calendário comum, e tal como em qualquer viagem que se preze, a antecipação da partida, os preparativos, "quem leva carro e dá boleia a quem, quem partilha quarto com quem, quem leva o pequeno-almoço para o 1º dia, a ida às compras, os preparativos para um dia inteiro de total descontração e "sessão de bronze" na praia, depois os caracois e as cervejolas na tasca da esquina antes do jantar e da grande noite, enfim, tudo faz parte do imenso prazer de estarmos juntas.
 
Escusado será dizer que:
-maridos não entram, apenas colaboram, para que tudo corra sobre rodas, e ficam com os herdeiros nas suas alegres casinhas, tentando adivinhar "o que será que elas estão a fazer!"
- Jamais lhes contamos ou a quem quer que seja, porque aqueles 2 dias são sagrados e exclusivamente nossos.
- Há sempre granel e bruáaaaa a perder de vista, mas sendo os divertimentos simples, e a conversa amena - às vezes - o mote é "bora lá despir a roupagem  de mulheres/mães/profissionais certinhas e compostinhas, e sem nunca ferir a liberdade alheia, cortimos cada minuto ao nosso ritmo, estando-nos nas tintas para os outros todos.
 
Cada ano é uma verdadeira festa, e a única pena é quando não conseguimos estar todas presentes. O resto, é-nos indiferente,
 
O curioso, é que conseguimos atingir um ponto tal de equilíbrio, partilha, confiança, irmandade, ternura, sentido crítico e bom-humor, que nos espantamos a nós próprias, e mais ainda, aos outros, próximos e distantes.
 
É frequente ouvirmos, com alguma razão, provavelmente, que "muita mulher junta não funciona". Pois tem funcionado fantásticamente, e no meio do ruído de tanta "galinha junta", temos permanecido isentas às invejinhas, às tricas sem interesse, à pequenina maldade mesquinha, aos segredinhos, ao corte. 
 
Olhando para nós 8 como se fosse espectadora de um sketch alheio, consigo aperceber-me das nuances das outras 7, das semelhanças e das diferenças, e o que sobressai, o "core" e o fundamental, é que o que nos une, sem dúvida, é superior ao que nos separa. Daí o sucesso da troupe!
 
Neste grupo de mulheres com idades entre os 35 e os 50 anos, há uma panóplia de cores muito diversas, verdadeiro arco-iris que varia entre tons fortes, permeado por meios tons:
 
- há "vermelhos" pujantes, com personalidades fortes, convicções inabaláveis e vontades férreas, capazes de fazerem as coisas acontecer, que lutam sem descanso por aquilo em que acreditam;
 
- há "azuis intensos", com uma imensa capacidade de aceitação da sua mudança, e com um imenso espírito de sacrifício, que prescindem das suas carreiras e do seu sucesso por um bem maior, em prol da felicidade da família e de terceiros;
 
- há "dourados luminosos", figuras que dão nas vistas pela sua beleza e inteligência, profissionais de gabarito reconhecidas pelos seus pares, dado o valor das suas realizações, mães e filhas extremosas que se desdobram em múltiplas facetas;
 
- há ainda espaço para "os beges", os supostamente apagadinhos. Conciliadores por natureza e diplomatas, têm opiniões sobre tudo e nada, mas evitam expressá-las, fugindo a sete pés de horríveis e incómodas discussões, que abominam. Quando "motivados", porém, revelam-se teimosos, capazes de arroubos de audácia e de uma coragem surpreendente, e lá dão "um arzinho da sua graça", mostrando um alter-ego "mauzinho", danadinhos pela crítica acutilante e e pela palhaçada.  
 
Daqui só pode sair "desgraça", isto é, "le vrai bordel"!
 
Este texto é uma homenagem que presto a esta troupe de amigas que começou há cerca de 22 anos, e que perdura até hoje, sem mácula. Qualquer semelhança com a realidade NÃO É FICÇÃO, é REAL! As 8 miúdas são verdadeiramente de carne e osso, que o digam os maridos e filhos, pais e sogros, cravados até à medula, chefes e subordinados que pressentem e "sofrem" na pele os nervos que antecedem estes encontros, porque a palavra de ordem é, "alto e pára o baile que hoje tenho que sair mais cedo, doa a quem doer, e se não gostarem, danou-se!".
Não é fácil para os outros, que se sentem tremendamente afectados pela força inevitável desta atracção, a da AMIZADE. Pois, temos muiiitaaaaaaaaa penaaaaa! 


terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Chanel, Chanel!

 
O ridículo dos outros que nos fica tão bem!
 
Um dia, lá atrás, um amigo disse algo que nunca esqueci: "Quem tem medo de fazer figuras ridículas é porque tem medo de se expôr". Aquilo mexeu comigo, porque ainda hoje tenho fobia do ridículo, e porém...
Quando observamos os outros no seu dia a dia, por vezes somos implacáveis na sua avaliação, mesmo que não o queiramos. Julgamo-los à luz de determinados pressupostos, e achamos que estamos isentos ou até imunes de incorrermos em situações semelhantes.
Lembro-me, com saudade, de momentos que partilhei com a minha Mãe, Avó e até amigas, em que "gozava" com momentos específicos que considerava hilariantes e até ridículos. Era bastante mais nova e com pouca experiência de vida, e como tal, detinha a sabedoria dos incautos, esses que acham que a vida é o aqui e agora, em que tudo é possível, sem limites, sem consequências! Vem o dia, mais à frente, em que a Vida nos troca as voltas, e com espanto, realizamos que não só nos "damos ao ridículo", como ainda por cima, trilhamos passos semelhantes, quase iguais, aos que criticámos a outros. Tem piada quando não é grave.
Chanel, Chanel, vem cá, onde te meteste? Todos os dias, ao longo dos últimos anos, eu e os outros moradores deste prédio ouvimos esta lengalenga, dita em tom de suave desespero, pela senhora que mora no 8º andar. Eu e a minha filha observámo-la muitas vezes da janela, e ríamo-nos do ritual diário da senhora viúva que passeia duas vezes por dia a sua cadelinha, e que a trata como membro da família, talvez a neta que nunca teve. Ridículo!
Chanel, Chanel, passou a ser um refrão que ambas entoávamos em coro, mal percebíamos a sua presença no parque exterior, donas de uma superioridade acima de qualquer reparo. Até ao dia em que Blackie entrou de rompante nas nossas vidas.

Cachorrinha de pelo negro, brilhante e macio, olhos dourados e meigos, orelhas sempre espetadas, morta de fome e carente de contacto humano, foi dar a casa dos meus sogros, à procura de um porto de abrigo em noite de temporal.
Escusado será dizer que fomos imediatamente adoptados por ela, com a total adesão e insistência da minha filha, que passou a considerá-la a “mana mais nova” que não tivera a sorte de ter!

Nos primeiros dias olhei-a desconfiada, incapaz de decidir se aceitava de bom grado aquela intromissão ao equilíbrio do nosso universo familiar, sobretudo porque a asma e as alergias que sempre me afligiram, impediram que houvesse espaço para animais, tanto em casa dos meus Pais, como em minha casa.
Com o passar dos dias, porém, essa resistência abrandou, fruto da surpreendente ausência de espirradelas e comichões, após contacto com a pequena hóspede de raça indeterminada, e lá me fui habituando à sua presença, grandemente facilitada pelas "graçinhas e brincadeiras próprias de tão tenra idade".
Adaptámo-nos tão facilmente à sua presença, que em menos de um ápice passamos a considerá-la como o mais novo membro da família, a quem chamamos carinhosamente "a nossa filha peluda africana”. 
Reflectindo sobre o quão irónica a vida pode ser, lembrei-me recentemente que a minha Avó materna teve uma cadelinha, durante alguns anos, quando os meus Pais ainda namoravam. Dona de casa aprimorada, senhora de rotinas diárias, ritmos rígidos e possessiva com os entes queridos, teve a dada altura que aceitar, resignada, a emancipação dos filhos. Procurou, por isso, um ser submisso, capaz de aceitar, sem reservas, ser o alvo do seu amor e esmeradas atenções.

Assim, adoptou a Micas, cadelinha tão estimada como se fosse uma filha mais nova, surgida fora de tempo. Micas era o ai Jesus da minha Avó que lhe falava como se esta tudo entendesse, leváva-a para todo o lado, provocando alguns embaraços e inclusivé, fazia-lhe roupa, umas camisolas de malha para a proteger das noites húmidas do cacimbo de Benguela, e "pior ainda", punha-lhe fralda quando ela estava com o cio e impedia-a de sair à rua sem a sua supervisão, porque a "ocasião faz o ladrão"! A virgindade da cadela foi motivo de chacota entre o grupo mais restrito de amigos, o que ofendeu profundamente a minha Avó, mais pelo tema discutido em público, do que pelo facto em si. 

O tempo passou e muita coisa mudou, mas hoje, óbviamente, somos nós o alvo da galhofa dos vizinhos sempre que saímos com a nossa cadelinha para passear, e dizemos, por nossa vez, no mesmo tom de suave desespero, a lengalenga " Blackie, vem cá Blackie..."

Blackie adoptou-nos com 5 meses, em Maio passado, estando connosco há 9 meses. Por mérito próprio, tornou-se membro de pleno direito desta família, contribuindo com uma quota parte de peso (10Kg) para o equilíbrio do quarteto. Em dias de frio, tem direito a vestir a sua camisola rosa, que contrasta lindamente com o seu pelo negro brilhante, e que a protege da húmidade da Serra de Sintra ou da Serra de Grândola, de onde é originária. Senhora de uma personalidade forte, exibe com orgulho e elegância a sua estirpe de membro de uma raça bem determinada, a de ser um cão de caça, um VERDADEIRO PODENGO PORTUGUÊS!